![](\"https:\/\/i0.wp.com\/brasildasaves.com.br\/wp-content\/uploads\/2015\/10\/Algodoal90.jpg?resize=683%2C1024\")
O japu (tamb\u00e9m conhecido como guaxo em algumas regi\u00f5es) \u00e9 uma ave comum em muitos estados do Brasil, com exce\u00e7\u00e3o de uma parte do Nordeste e do Sul. Da fam\u00edlia dos xex\u00e9us e ira\u00fanas (a\u00a0Icteridae<\/em>) ele \u00e9 um engenhoso construtor e um bicho soci\u00e1vel. Os japus costumam eleger uma mesma \u00e1rvore para formar a \u201ccol\u00f4nia\u201d de ninhos, que ficam pendurados como brincos nos galhos mais expostos \u2013 concentrados, eles t\u00eam prote\u00e7\u00e3o m\u00fatua contra predadores. O ninho \u00e9 normalmente feito com fibras naturais entrela\u00e7adas de maneira engenhosa, formando uma esp\u00e9cie de bolsa, com entrada por cima.<\/p>\n Na Ilha do Algodoal (PA), no entanto, os japus decidiram inovar. Ali eles fazem ninhos no manguezal, \u00e0 beira de canais que se ligam com o oceano. E usam como mat\u00e9ria-prima uma fibra abundante na regi\u00e3o, mas que n\u00e3o tem nada de natural: linhas de n\u00e1ilon de antigas cordas de redes e boias de navega\u00e7\u00e3o que v\u00eam dar no mangue trazidas pela mar\u00e9. O efeito visual \u00e9 impressionante. Como a maioria das cordas usadas por pescadores ali \u00e9 azul, os ninhos acabam tomando essa cor, fazendo um contraste interessante com o verde das folhas no manguezal. O uso de materiais estranhos, no entanto, n\u00e3o \u00e9 desconhecido na ci\u00eancia. Acompanhe uma pequena entrevista com o ornit\u00f3logo Luciano Lima, pesquisador do Observat\u00f3rio de Aves \u2013 Instituto Butantan.<\/p>\n Blog: A mudan\u00e7a de h\u00e1bitos alimentares e de comportamento em fun\u00e7\u00e3o de altera\u00e7\u00f5es no ambiente \u00e9 comum entre as aves? \u00c9 algo esperado encontrar situa\u00e7\u00f5es como essa dos japus em Algodoal?<\/strong><\/p>\n Luciano Lima:<\/strong> A capacidade de se adaptar a mudan\u00e7as no ambiente e\/ou novos recursos, no caso material para constru\u00e7\u00e3o do ninho, \u00e9 o que permite que algumas esp\u00e9cies ocorram, ou mesmo aumentem sua popula\u00e7\u00e3o, em ambientes alterados, como \u00e1reas urbanas. Comportamentos inovadores est\u00e3o sujeito ao \u201colhar\u201d atento da sele\u00e7\u00e3o natural. Dessa forma, embora n\u00e3o seja raridade observar uma determinada esp\u00e9cie fazendo algo \u201cinesperado\u201d, a probabilidade que esse comportamento seja fixado, ou seja, passe a fazer parte daquela popula\u00e7\u00e3o, ou mesmo esp\u00e9cie, \u00e9 geralmente remota.<\/p>\n Bog: O uso de uma fibra artificial nos ninhos pode afetar de alguma maneira a popula\u00e7\u00e3o?<\/strong><\/p>\n Luciano Lima:<\/strong> Por se tratar de um comportamento diretamente relacionado com uma parte importante do ciclo de vida da esp\u00e9cie, no caso sua reprodu\u00e7\u00e3o, o uso das fibras artificiais poderia sim afetar positivamente, ou negativamente essa popula\u00e7\u00e3o. Para responder essa pergunta seria necess\u00e1rio um estudo mais detalhado. Mas podemos assumir pelo menos tr\u00eas hip\u00f3teses. 1) que as fibras artificiais trazem alguma vantagem para esp\u00e9cie deixando, por exemplo, os ninhos mais resistentes ao clima ou aos predadores; 2) que elas representam uma desvantagem, por exemplo atraindo mais predadores por conta de sua colora\u00e7\u00e3o menos discreta ou \u00e9 poss\u00edvel ainda que as fibras esquentem mais o que poderia representar um problema no calor amaz\u00f4nico; e 3) que as fibras artificiais seriam equivalentes \u00e0s fibras naturais e n\u00e3o representariam qualquer vantagem ou desvantagem significativa.<\/p>\n Blog: H\u00e1 outros casos curiosos de “inova\u00e7\u00e3o” no comportamento das aves?<\/strong><\/p>\n Luciano Lima:<\/strong> Existem outros casos interessantes relacionados com a constru\u00e7\u00e3o de ninhos com materiais pouco convencionais. Pessoalmente j\u00e1 observei no Parque Nacional do Itatiaia alguns ninhos de guaxe (Cacicus haemorrhous)\u00a0<\/em>constru\u00eddos tamb\u00e9m com fibra artificial, mas de colora\u00e7\u00e3o verde. Alguns dos casos mais inusitados de constru\u00e7\u00e3o de ninho com materiais artificiais por aves brasileiras envolvem alguns parentes de um habilidoso \u201cpedreiro\u201d, o jo\u00e3o-de-barro (fam\u00edlia Furnariidae). Existem reportados na literatura cient\u00edfica alguns ninhos de esp\u00e9cies como o curuti\u00e9 (Certhiaxis cinnamomeus<\/em>) e o jo\u00e3o-tenen\u00e9m (Synallaxis spixi<\/em>) constru\u00eddos inteiramente com peda\u00e7os de arame. O grande ornit\u00f3logo Helmut Sick, comenta em seu livro \u201cOrnitologia Brasileira\u201d, sobre um ninho de jo\u00e3o-tenen\u00e9m encontrado na cidade do Rio de Janeiro \u201cconstru\u00eddo em boa parte de arame (inclusive farpado) que as aves catavam em f\u00e1brica pr\u00f3xima\u201d, cujo peso aproximado chegava a 15kg!<\/p>\n","protected":false},"excerpt":{"rendered":" O japu (tamb\u00e9m conhecido como guaxo em algumas regi\u00f5es) \u00e9 uma ave comum em muitos estados do Brasil, com exce\u00e7\u00e3o de uma parte do Nordeste e do Sul. Da fam\u00edlia dos xex\u00e9us e ira\u00fanas (a\u00a0Icteridae) ele \u00e9 um engenhoso construtor e um bicho soci\u00e1vel. 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