Legado das Águas – a vida (selvagem) como ela é
Posted on: December 18, 2016, by : admin“Nunca achei que em São Paulo daria para encontrar a floresta assim, a perder de vista”. As palavras vinham de um observador de aves. Acostumado a viajar para confins da Amazônia e outras paragens inabitadas, ele demonstrava a surpresa de estar em um dos maiores trechos de Mata Atlântica preservada do país, a apenas 1h30 de viagem da capital paulista. O Legado das Águas, nome dado à reserva mantida pelo grupo Votorantim, tem 31 mil hectares, com muitos trechos de floresta intocada. Sua história está ligada à visão do empresário Antônio Ermírio de Moraes: há décadas ele decidiu deixar a mata em pé como maneira de assegurar água para mover as usinas hidrelétricas que fornecem energia à indústria. Com isso, ele ajudaria a manter também um retrato vivo da nossa biodiversidade. O Legado hoje abriga diversos projetos de pesquisa ligados à fauna e à flora da Mata Atlântica (e vale também conhecer o brilhante trabalho fotográfico que Luciano Candisani realiza na área). Mas nem só os pesquisadores irão poder desfrutar desse ambiente, segundo o projeto dos administradores. Aí entram os observadores de aves na história – a reserva deve ser aberta à visitação em 2017.
Estive entre os birders convidados para uma incursão experimental à área. Durante dois dias, nosso grupo explorou trilhas em meio à mata e andou pelas bem-conservadas estradas de serviço que ligam as usinas (todas elas cortando a floresta). Foram mais de 141 espécies observadas, muitas delas endêmicas da Mata Atlântica – com direito a figurinhas difíceis mesmo a observadores experimentados. Não é todo dia que você anda em uma trilha onde chegam a ser comuns aves como o não-pode-parar (Phylloscartes paulista), o zidedê (Terenura maculata) e a choquinha-pequena (Myrmotherula minor). E mesmo nas estradas, nas bordas da mata, podem ser encontradas espécies de fazer brilhar o olho, como o tropeiro-da-serra (Lipaugus lanioides) e o sabiá-cica (Triclaria malachitacea) – um sabiá que não é sabiá, pois se trata de um papagaio endêmico do Brasil. O nome vem da sua capacidade de emular o canto de um Turdus.
O Legado das Águas tem tudo para se transformar em poucos anos em um dos principais destinos de birdwatching do Brasil. O trabalho de levantamento de avifauna ainda está em curso no lugar, mas os pesquisadores já estimam em mais de 300 as espécies na área. Junte-se isso à segurança (o acesso é controlado e há seguranças percorrendo a área todo o tempo), à proximidade com São Paulo (e com os aeroportos de Congonhas, Guarulhos e Campinas), e à possibilidade de encontrar diversas aves endêmicas – está formado o quadro para atrair observadores brasileiros e dos quatro cantos do mundo. Como bônus, há a possibilidade de incluir outras áreas próximas em um roteiro de birding mais extenso – não à toa, o recorde brasileiro de aves observadas em 24h no Brasil foi batido este ano em um roteiro que começava no Legado e terminou na Ilha Comprida, no litoral paulista.
A estrutura para receber os observadores já está sendo planejada na reserva. Ela inclui hospedagem e guias especializados. Além disso, há o plano de inserir também a observação em um contexto mais amplo, de educação ambiental. Assim não só os observadores de hoje, mas os do futuro, terão o prazer de conhecer a Mata Atlântica e suas espécies maravilhosas.
Lugar espetacular, espero um dia ter o prazer de visitar e fotografar.
Fantástico, como escoteiro, observador de aves, conservacionista acredito que é possível harmonia entre homem e natureza.
Aguardando a abertura deste paraíso.